Imunoterapia: como age e quais são os efeitos colaterais?

Dr. Gustavo Schvartsman • 29 de outubro de 2018

Muitos provavelmente ouviram falar da imunoterapia no tratamento do câncer. Seu conceito surgiu há pelo menos 30 anos, mas seu uso rotineiro na prática clínica começou em 2012, nos Estados Unidos. Em 2018, trouxe o prêmio Nobel de Fisiologia e Medicina a dois pesquisadores por seus trabalhos na década de 90.

 

Os medicamentos agem de uma maneira diferente da quimioterapia. São drogas que treinam o sistema imunológico a atacar o câncer, destravando mecanismos que as células tumorais colocaram para desativar nossas células de defesa.  O ataque ao câncer é indireto, via sistema imune, em vez de diretamente destruir células boas e ruins, como é o caso da quimioterapia.

 

Por ser um medicamento que usa uma via mais fisiológica e específica do nosso corpo, que é o sistema imune, os efeitos colaterais são geralmente mais brandos. Com o tipo mais comum de imunoterapia - os inibidores da via chamada PD-1 - cerca de 5 a 10% dos pacientes apresentam efeitos colaterais importantes, comparado a 40-50% dos casos com quimioterapia. Porém, os eventos adversos podem ser fatais em cerca de 1 a 2% desses casos, ao se utilizar as drogas disponíveis no mercado brasileiro: pembrolizumab (Keytruda), nivolumab (Opdivo), atezolizumab (Tecentriq), ipilimumab (Yervoy), avelumab (Bavencio) e durvalumab (Imfinzi).

 

Os efeitos colaterais da imunoterapia freqüentemente diferem daqueles comumente observados com outros tipos de tratamento contra o câncer. A maioria ocorre por uma super-ativação do sistema imune, que pode atacar células do próprio corpo. Veja o que os pacientes devem saber:

 

- Fadiga:

Como acontece com muitas terapias contra o câncer, a fadiga tende a ser uma das mais comuns. Muitas vezes são causadas pela própria doença, particularmente quando o tratamento não está sendo efetivo, mas pode ser um dos sintomas de disfunções hormonais, como baixos níveis de hormônio da tireoide ou cortisol. A maioria dos casos é leve e não necessita de intervenção.

 

- Diarreia:

A inflamação do trato gastrointestinal, principalmente o intestino grosso, pode desencadear diarreia. Pode ser um quadro leve, mas uma diarreia liquida, volumosa e com muitos episódios por dia pode acontecer. Deve ser prontamente comunicada ao seu médico, pois o tratamento com corticoides tem que ser imediato, pelo risco de desidratação grave. Em alguns casos, a droga tem que ser interrompida, e por vezes permanentemente.

 

- Alterações hormonais: tireoide

A glândula tireoide pode ficar inflamada, assim como ocorre na tireoidite de Hashimoto, que acontece muito com mulheres. Com a imunoterapia, pode se manifestar inicialmente com um hipertireoidismo, pela destruição maciça de tecido tireoidiano e liberação de hormônios no sangue. Depois, segue-se um hipotireoidismo. A fase de hipertireoidismo pode se manifestar como batedeira no peito, suor excessivo, perda de peso, irritabilidade, fadiga, diarreia. Nem sempre essa fase ocorre. A fase do hipotireoidismo pode causar ganho de peso, sonolência, depressão, fadiga, inchaço no corpo. O tratamento é com a reposição de hormônios e não é necessário interrupção da droga.

 

- Alterações hormonais: hipofisite

Um dos efeitos colaterais mais raros, porém mais preocupantes, é a hipofisite - inflamação da glândula pituitária. O maior desafio é que ele se manifesta de muitas maneiras e só pode ser definitivamente determinado com o trabalho de sangue. O paciente pode sentir fadiga, febre, dor de cabeça ou alterações visuais. O tratamento pode envolver corticoides, mas na maior parte das vezes apenas a reposição dos hormônios que estão baixos é suficiente.

 

- Hepatite:

A inflamação do fígado geralmente não traz sintomas, sendo detectada na maior parte dos casos por alterações nas enzimas hepáticas. O tratamento envolve corticoides, pois mesmo assintomáticos, os pacientes podem evoluir com disfunção hepática grave se não identificada precocemente e tratada.

 

- Inflamação de outros órgãos:

Qualquer órgão do nosso corpo está suscetível a inflamações. Órgãos como pulmão, coração e sistema nervoso também podem ser acometidos. A frequência é muito menor, mas quando ocorre, os efeitos podem ser muito graves e geralmente são a causa dos poucos óbitos que observamos nos estudos. Sintomas como dor torácica, falta de ar, tosse, alterações de movimento e sensibilidade e dor de cabeça são sintomas de alarme e devem ser prontamente comunicados. O tratamento com imunossupressão rápida é imperativo.

 

Não sabemos com certeza quais pacientes de imunoterapia têm mais probabilidade de sofrer esses efeitos colaterais. Os efeitos colaterais não tendem a estar relacionados ao tipo de câncer, mas ao tipo de droga de imunoterapia que o paciente recebe. A combinação de dois imunoterápicos é muito mais tóxica do que o uso isolado, por exemplo.

 

Os efeitos colaterais geralmente aparecem no início do tratamento - mas alguns, principalmente os endócrinos, podem aparecer meses ou anos depois. Quando ocorrem, com o tratamento adequado,  podem resolver dentro de uma a três semanas. No entanto, como essas terapias ainda são relativamente novas, o aprendizado é constante e um médico familiar com seus efeitos deve sempre ser priorizado.

 

O gerenciamento de efeitos colaterais depende da gravidade. Muitos pacientes que recebem imunoterapia provavelmente já receberam quimioterapia, então eles são capazes de lidar melhor com os efeitos colaterais mais leves. O principal agente para controle de efeitos adversos da imunoterapia é o corticoide, pois leva a um pronto arrefecimento do sistema imune. Em alguns casos mais graves, pode ser necessário outros imunossupressores mais fortes, como infliximabe ou micofenolato. O desmame da dose de corticoide deve ser lento e gradual, para evitar com que os sintomas voltem. Em alguns casos, a depender da gravidade do quadro, o imunoterápico tem que ser descontinuado permanentemente.

 

Embora uma tosse ou um leve exantema possa não parecer preocupante, pode ser um sinal precoce de algo mais sério. É por isso que recomendamos uma comunicação aberta com seus pacientes para que todos os efeitos colaterais experimentados sejam compartilhados rapidamente.

 

A boa notícia é de que, aparentemente, para alguns tipos de tumores, ter algum efeito colateral é sinal de que o sistema imune esteja ativado e pode estar sendo efetivo contra o câncer. Isso não deve interferir, porém, no rápido manejo com corticoides se necessário, uma vez que já está documentado que o uso temporário de corticoides não atrapalha os resultados a longo prazo da imunoterapia.


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A imunoterapia revolucionou o tratamento do câncer ao estimular o próprio sistema imunológico do paciente a combater as células tumorais. Diferente da quimioterapia e da radioterapia, que agem diretamente sobre o tumor, a imunoterapia fortalece as defesas naturais do organismo. Mas será que a imunoterapia funciona em todo câncer? A resposta exige uma análise cuidadosa sobre o funcionamento da técnica, os tipos de tumores que mais respondem ao tratamento e as limitações ainda existentes. Continue a leitura para entender como a imunoterapia funciona, quais pacientes podem se beneficiar e o que a ciência já descobriu até agora. O que é imunoterapia? A imunoterapia é uma forma de tratamento que estimula o sistema imunológico do próprio paciente a reconhecer e combater as células cancerígenas. Ela funciona como uma espécie de “reeducação” das defesas naturais do corpo, ajudando-as a identificar e atacar o tumor com mais precisão. Existem diferentes tipos de imunoterapia utilizados na prática clínica, como: Inibidores de checkpoint imunológico, que liberam os “freios” do sistema imune (ex.: anti-PD-1, PD-L1 e CTLA-4) Terapias com células T, incluindo as células CAR-T Vacinas terapêuticas, desenvolvidas para estimular respostas específicas contra o câncer Citocinas, como interleucinas e interferons, que aumentam a resposta imune Anticorpos monoclonais , que reconhecem alvos específicos nas células tumorais A proposta é tornar o sistema imunológico mais ativo e eficaz contra tumores que, muitas vezes, conseguem escapar da vigilância natural do organismo. Imunoterapia funciona em todo câncer? Não. Apesar dos avanços recentes, a imunoterapia não funciona em todo câncer . A resposta ao tratamento depende de características específicas de cada tumor, como: Expressão de biomarcadores, como PD-L1 Carga mutacional elevada (TMB) Presença de inflamação no microambiente tumoral (“tumores quentes”) Instabilidade de microssatélites (MSI-H) Em resumo, a eficácia da imunoterapia está diretamente ligada ao perfil biológico do câncer. Ainda não existe uma solução universal, mas as indicações têm crescido com o avanço das pesquisas. Por isso, é fundamental que todos os tipos de tumor sejam testados adequadamente para avaliar o potencial benefício da imunoterapia, mesmo os subtipos com menor probabilidade de eficácia. Como exemplo, já tive pacientes com câncer de mama que não eram elegíveis à imunoterapia por serem hormônio-positivos, porém com rara carga mutacional altíssima, que viabilizou o tratamento bem-sucedido. Assista ao vídeo:
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